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Quando somos apresentados pela primeira vez aos números negativos, dizem-nos que ao multiplicarmos dois números menores que zero encontramos um número positivo, de modo que, por exemplo, (-2) x (-3) = +6. Isso muitas vezes parece bastante intrigante.

O primeiro ponto que devemos notar é que, partindo das convenções habituais da aritmética sobre os números positivos, temos a liberdade de definir (-2) x (-3) como bem entendermos. Poderia ser -99, ou 127π, se desejarmos. Portanto, a principal questão não é quanto ao valor real, e sim quanto ao valor adequado. Diversas linhas de pensamento convergem para o mesmo resultado, isto é, que
(-2) x (-3) = +6. Incluí aqui o sinal + para enfatizar.

Mas por que isto é adequado?

Eu gosto da ideia de interpretar um número negativo como uma dívida. Por exemplo, se minha conta no banco contém -R$3,00, então eu devo R$3,00 ao banco. Suponha que minha dívida seja multiplicada por 2 (positivo): nesse caso, ela certamente se transformará em uma dívida de R$6,00. Portanto, faz sentido insistir que (+2) x (-3) = -6. No entanto, o que seria (-2) x (-3)? Bem, se o banco cancelar amavelmente duas dívidas de R$3,00 cada uma, eu terei R$6,00 a mais, ou seja, minha conta se alterou exatamente como se alteraria se eu tivesse depositado +R$6,00. Portanto, em termos bancários queremos que (-2) x (-3) seja igual a +6.

O segundo argumento é que (+2) x (-3) e (-2) x (-3) não podem ser ambos iguais a +6. Se fosse assim, poderíamos eliminar o -3 e deduzir que +2 = -2, o que é um absurdo.

O terceiro argumento se inicia ressaltando uma premissa não declarada no segundo argumento: de que as leis habituais da aritmética devem continuar válidas para os números negativos. E prossegue, acrescentando que esse é um objetivo razoável, ainda que seja apenas pela elegância matemática. Se quisermos que as leis habituais continuem válidas, então

(+2) x (-3) + (-2) x (-3) = (2-2) x (-3) = 0 x (-3) = 0.

Portanto,

-6 + (-2) x (-3) = 0

Somando 6 a ambos os lados, vemos que:

(-2) x (-3) = +6

De fato, um argumento semelhante justifica que (+2) x (-3) é igual a -6.

Juntando todas as ideias: a elegância matemática nos leva a definir que menos vezes menos é igual a mais. Em aplicações como nas finanças, essa escolha se adapta diretamente à realidade. Assim, além de mantermos a simplicidade da aritmética, acabamos com um bom modelo para certos aspectos importantes do mundo real.

Poderíamos fazer a coisa de um jeito diferente, mas acabaríamos complicando a aritmética e reduzindo sua aplicabilidade. Basicamente, essa é a melhor solução. Ainda assim, “menos com menos dá mais” é uma convenção humana consciente, e não um fato inevitável da natureza.

É isso aí.

Abraços e até amanhã.

Ju.

5 comentários:

  1. ainda me lembro de como a professora ensinava isso na quinta série:
    Amigo do meu amigo é meu amigo
    Amigo do meu inimigo é meu inimigo
    Inimigo do meu inimigo é meu amigo

    Um amigo meu fez sua monografia para o curso de licenciatura em matemática justamente abordando este assunto. De fato é um grande nó na cabeça das crianças, afinal, não temos "dedos negativos" para nos ajudar a contar... mas explicações como essa podem ajudar a esclarecer as alunos!

  1. Olá Marcos, legal tb este seu método.
    Não o conhecia!
    Faltou o inimigo do meu amigo é meu inimigo né?
    Abraços e obrigada por participar do blog.
    Ju

  1. Legal

  1. Não concordei com a parte que diz que é uma convenção humana. Na minha opnião isso é resultado de um processo natural. A regra dos sinais não é uma definição. É consequência de propriedades fundamentais dos números, que são anteriores.

    Sabemos que o conjunto dos números reais é um corpo (utilizando linguagem atual). Isto significa que valem as seguintes propriedades para adição e multiplicação:

    x,y ∈ IR ⇒ x+y ∈ IR e x.y ∈ IR

    x+y=y+x e xy = yx

    (x+y)+z = x+(y+z) e (xy)z = x(yz)

    x(y+z) = xy + xz

    ∃0 ∈ IR tal que x+0=x

    ∃1 ∈ IR tal que 1.x=x

    Para cada x real corresponde um único numero (-x) real e um unico (1/x) (nesse segundo caso, x diferente de 0) tal que

    x+(-x) = 0 e x.(1/x)=1

    Podemos deduzir a regra dos sinais a partir disso, notando que:

    x.1 = x => (-1)1 = (-1) menos com mais = menos
    x.1 + x.0 = x(1+0) = x.1 = x => x.0 = 0 (propriedade***)

    (-1)(-1) + (-1) = ?
    usando a propriedade do elemento neutro da multiplicação, temos:
    (-1)(-1)+(-1).1 = ?
    usando a propriedade distributiva da multiplicação em relação a adição temos:
    (-1){(-1)+1} = ?
    utilizando a ultima propriedade, temos:
    (-1){0} = ?
    utilizando a propriedade*** que deduzimos antes, temos:
    0 = ?
    Portanto,
    (-1)(-1) + (-1) = 0
    donde
    (-1)(-1) + (-1) + (1) = 1
    (-1)(-1) = 1 (famoso menos com menos = mais)

  1. Olá Gustavo,
    Parabéns, é uma forma de demonstrar.
    Abraços.